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No final da década de 1990, surgiu um novo instituto jurídico-econômico voltado para a proteção e tutela do meio ambiente: o Pagamento por Serviços Ambientais (PSA).
Desde a década de 1980, estudiosos das áreas jurídica, econômica e ecológica alertavam sobre a ineficiência das leis ambientais repressivas em promover uma proteção ambiental eficaz. Com o rápido avanço da degradação ambiental, tornou-se evidente a necessidade de um novo planejamento estrutural para proteger o meio ambiente de forma eficaz.
Nesse contexto, o pagamento por serviços ambientais emergiu como um dos primeiros e mais eficientes instrumentos de proteção ambiental, fundamentados em princípios de direito promocional e sanção premial.
A primeira mudança proposta na sistemática do PSA diz respeito ao seu objeto de proteção. As abordagens clássicas focavam na proteção direta dos recursos naturais, que poderiam ser apropriados pelo ser humano para atender às suas necessidades. Embora a proteção ambiental deva abranger toda a natureza, o foco estava nos recursos diretamente aproveitáveis pelo ciclo econômico.
Com a sistemática do PSA, o enfoque passou a ser os serviços ambientais prestados. Essa mudança ocorreu devido à descoberta de um conjunto de benefícios fornecidos pelo meio ambiente, essencial para a manutenção da vida e para o exercício de qualquer atividade econômica. Esses serviços, embora não sejam diretamente aproveitáveis economicamente, são fundamentais para a existência dos bens naturais.
Durante um longo período, a humanidade marginalizou a importância dos serviços ambientais para a qualidade de vida e o ciclo econômico, considerando-os benefícios não diretamente apropriáveis e desprovidos de valorização. Essa ausência de valorização gerou uma impressão errônea de que esses serviços são infinitos, o que resultou em seu uso descontrolado e invasivo. Essa concepção começou a ser questionada a partir de 1997, quando a relevância dos serviços ambientais passou a ser amplamente considerada.
Os serviços ambientais estão intimamente associados ao conceito de meio ambiente como um “macrobem”. Nessa perspectiva, não se deve considerar o meio ambiente de forma fragmentada, separando o meio natural do artificial; a existência de serviços deve incluir o ser humano como um ator importante e prestador desses serviços.
O relatório da Organização das Nações Unidas (ONU) de Avaliação Ecossistêmica do Milênio, publicado em 2005, descreveu uma vasta gama de serviços prestados pela natureza em diferentes contextos e ecossistemas, estabelecendo quatro categorias principais:
A crescente carência desses serviços, conforme destacado na Avaliação Ecossistêmica do Milênio, justifica sua proteção através do PSA.
Surge, portanto, uma nova perspectiva sobre as externalidades, permitindo centralizar a atuação não apenas nos agentes econômicos que poluem ou degradam o meio ambiente, mas também oferecer incentivos econômicos para aqueles que promovem sua conservação.
Outro aspecto relevante do PSA é a necessidade constante de adequação da política à realidade social. É fundamental que o programa de pagamento por serviços ambientais seja implantado de forma a permitir uma associação e articulação com outras políticas ambientais em vigor, que deverão servir de modelo na elaboração de futuras políticas públicas.
O pagamento por serviços ambientais representa, desse modo, um dos mecanismos econômicos mais promissores para a proteção do meio ambiente. Sua multifuncionalidade permite aplicação em diversas áreas, incluindo a gestão de resíduos sólidos, alinhando-se à Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei Federal nº 12.305/2010) e às Diretrizes Nacionais para o Saneamento Básico.
Limitar o PSA exclusivamente à proteção de determinados serviços ambientais resulta em uma tutela incompleta e desproporcional ao meio ambiente, desconsiderando a importância do meio artificial, cultural e do trabalho. Necessária a criação e aplicação de programas de Pagamento por Serviços Ambientais Urbanos (PSAU).
Ressalta a doutrina, que os serviços ambientais urbanos podem ser conceituados como “o pagamento realizado aos agentes sociais que promovem a reinserção de produtos descartados visando seu reaproveitamento por parte dos agentes econômicos, garantindo dessa forma uma poluição postergada”[1]. Frise-se que tais serviços já se encontram inseridos na sistemática da Política Nacional de Resíduos Sólidos, regulamentada pelo Decreto Federal nº 7.404/2010. Este decreto prevê expressamente o “pagamento por serviços ambientais”, embora a legislação ainda careça de um desenvolvimento mais robusto.
Apesar da recente aprovação da Lei Federal nº 14.119, de 13 de janeiro de 2021, que institui a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais (PNPSA), a legislação ainda necessita de aprimoramentos, especialmente para efetivar os serviços ambientais urbanos.
O pagamento por serviços ambientais é uma transação voluntária, onde um pagador transfere recursos financeiros ou outra forma de remuneração a um provedor de serviços ambientais, conforme acordado. Esse mecanismo regulatório recompensa aqueles que protegem a natureza e mantêm os serviços ambientais, independentemente de serem prestados em favor do meio natural ou do meio urbano.
Além disso, é fundamental buscar valor econômico aos serviços ecossistêmicos, criando um nicho de mercado que proteja as fontes desses serviços, considerando sua sensibilidade e finitude. As atividades que favorecem a manutenção, recuperação ou melhoria dos serviços ecossistêmicos devem ser claramente definidas.
Embora a PNPSA preveja genericamente a inclusão de serviços de “decomposição de resíduos” entre os serviços ecossistêmicos de suporte, diversas entidades têm alertado para a necessidade de uma estruturação jurídica que ofereça suporte normativo, evitando que a previsão do PSA se torne inócua.
Os resíduos sólidos representam um componente econômico e social significativo. Sua gestão é eficiente e compatível com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU, especialmente os ODS 12.4, 12.5 e 12.7. Portanto, é necessário realizar modificações pontuais na PNPSA, incluindo inequivocamente o Pagamento por Serviços Ambientais Urbanos (PSAU).
[1] OLIVEIRA LIMA, Ítalo Wesley Paz de. O pagamento por serviços ambientais urbanos na Política Nacional de Resíduos Sólidos: instrumento para o desenvolvimento sustentável no espaço urbano. Dissertação (Mestrado em Direito). Universidade Federal da Paraíba. P. 115.