X
Area de atuação Destaques noticias e artigos
A Guia de Utilização (GU) tem como principal objetivo permitir a extração temporária e experimental de recursos minerais em áreas ainda em fase de pesquisa mineral. Ela é concedida pela Agência Nacional de Mineração (ANM) e permite que o titular de um alvará de pesquisa realize a extração limitada de uma substância mineral, enquanto avalia a viabilidade econômica da exploração em larga escala. Essa extração temporária também auxilia no financiamento das atividades de pesquisa e na obtenção de dados complementares que podem ser utilizados na elaboração do Relatório Final de Pesquisa.
A primeira aparição da Guia de Utilização no ordenamento jurídico brasileiro ocorreu com a reforma do Código de Mineração promovida pelo Decreto-Lei nº 227/1967, que passou a prever a possibilidade de extração temporária em caráter experimental. Posteriormente, normas complementares a regulamentaram de forma mais detalhada, conforme demonstrado abaixo.
No que se refere a normas semelhantes em outros países, existem sistemas que permitem a “extração experimental de minerais” em várias jurisdições. Por exemplo, nos Estados Unidos, o Bureau of Land Management (BLM) concede permissões temporárias para mineração em terras federais sob o regime de “Exploration Licenses” ou “Prospecting Permits”, que permitem a exploração de substâncias minerais em caráter temporário para avaliação econômica, de forma semelhante à GU no Brasil. No Canadá, existe a “Exploration Permit” em várias províncias, que permite a realização de atividades exploratórias e testes de extração em áreas com autorização para pesquisa mineral.
Embora os termos variem, o objetivo em muitos países é permitir que os titulares de direitos minerários possam realizar extração limitada para fins de estudo econômico e técnico, de forma semelhante ao conceito da Guia de Utilização no Brasil.
A aprovação da Guia de Utilização está prevista na legislação mineral, em especial no Código de Mineração (Decreto-Lei nº 227/1967), o Decreto nº 9.406/2018 (Regulamento do Código de Mineração), a Portaria DNPM nº 155/2016 e a Resolução ANM nº 37/2020. Essas normativas fornecem as bases regulatórias e legais para a concessão da Guia de Utilização (GU) e delineiam os critérios que podem impedir sua aprovação.
O pedido de Guia de Utilização deve ser dirigido à Agência Nacional de Mineração (ANM), que é o órgão responsável pela análise técnica e pela concessão das GU’s em conformidade com a legislação mineral e ambiental. A solicitação deve ser acompanhada de documentos técnicos e de viabilidade econômica, além das licenças ambientais pertinentes.
A Guia de Utilização (GU) pode ser emitida por um período de até 3 (três) anos. Esse prazo começa a ser contado a partir da publicação do ato administrativo de concessão da GU no Diário Oficial da União (DOU) e se mantém de forma contínua por até 3 (três) anos. A validade da GU, ou seja, o período durante o qual ela terá efeitos práticos, será coincidente com a duração da Licença de Operação (LO) ambiental, desde que não ultrapasse o prazo máximo de 3 (três) anos, podendo ser prorrogada por mais 3 (três) anos.
A vigência da GU se inicia com sua publicação no Diário Oficial da União. Sua eficácia estará vinculada à validade da Licença Ambiental para lavra, respeitando o limite de 3 (três) anos. Além disso, a GU pode ser respaldada por uma Licença de Operação anterior, desde que atenda aos requisitos previamente estabelecidos na legislação.
Alguns exemplos de minerais que podem ser objeto de pedido de GU incluem, dentre outras substâncias, os minérios de ouro, zinco e de manganês, o ferro, as pedras preciosas (gemas), a gipsita. Esses minerais, dependendo de sua localização e características geológicas, podem ser explorados de forma experimental antes da concessão da lavra definitiva. Em contrapartida, outros minerais, a priori, não podem ser objeto de GU, pois apenas excepcionalmente a Diretoria Colegiada da ANM poderá conceder a GU para outras substâncias não previamente relacionadas na legislação. Para tal condição é necessário instruir pedido com justificativas técnicas e econômicas.
O art. 22 do Código de Mineração estabelece que o titular de uma autorização de pesquisa deve realizar a pesquisa mineral com a finalidade de definir a jazida e apresentar o Relatório Final de Pesquisa à ANM, com os resultados obtidos. Para a aprovação de uma Guia de Utilização, é essencial que o estágio da pesquisa mineral seja avançado e justifique a extração em caráter experimental.
A não comprovação da real necessidade de extração em caráter experimental, conforme estipulado pela pesquisa mineral, pode configurar um impedimento direto à concessão da GU. O art. 28 da Portaria DNPM nº 155/2016 estabelece que a GU só será concedida em casos de real necessidade para a continuidade dos estudos de pesquisa mineral. A ausência de justificativa técnica e econômica clara sobre a urgência da extração temporária pode ser motivo de indeferimento, uma vez que a GU não deve ser utilizada como uma antecipação do direito de lavra definitiva.
Já os artigos 102 a 122 da Portaria DNPM nº 155/2016 tratam especificamente do procedimento para requerimento da Guia de Utilização. Esses artigos estabelecem requisitos técnicos, documentais e legais que o requerente deve cumprir, sendo que dentre as principais condições que podem impedir a aprovação da GU encontramos o Plano de Aproveitamento Econômico (PAE), o qual deve ser apresentado junto ao pedido da GU, demonstrando que a extração experimental terá viabilidade econômica e técnica. A ausência ou inadequação do PAE pode resultar no indeferimento da GU.
O art. 106 menciona o Relatório Parcial de Pesquisa, onde para justificar o pedido da GU, o titular da autorização deve apresentar um Relatório Parcial de Pesquisa, com os dados que comprovem a necessidade da extração temporária para a continuidade das atividades de pesquisa. A falta deste relatório ou sua insuficiência técnica pode configurar impedimento.
O art. 111 informa que o requerente deve apresentar uma proposta clara e detalhada de lavra, que deve ser compatível com a metodologia da pesquisa mineral em andamento. O artigo determina que essa proposta contenha o plano de execução das atividades de extração, o que inclui o dimensionamento da área e o volume de material a ser extraído. Caso essa proposta seja considerada inadequada, o pedido será indeferido.
O art. 115: destaca que o requerente deve obter o licenciamento ambiental para a área onde ocorrerá a extração. A existência de restrições ambientais que inviabilizem a operação podem ser obstáculos para a concessão da GU.
A Resolução ANM nº 37/2020 modernizou os procedimentos de outorga de títulos minerários, incluindo a Guia de Utilização, e trouxe novas exigências e especificidades que impactam diretamente a aprovação ou indeferimento da GU.
O art. 8º destaca que os documentos apresentados pelo requerente devem estar em conformidade com as normativas da ANM. Caso sejam detectadas inconsistências, omissões ou falhas, o pedido pode ser indeferido.
Outra situação impeditiva é a sobreposição de direitos minerários. Nos termos do art. 19 do Código de Mineração, a ANM pode indeferir a GU se houver sobreposição ou conflito com áreas já outorgadas a outros mineradores. A ANM tem a prerrogativa de avaliar se o requerente possui exclusividade sobre a área para que a extração temporária seja autorizada.
Já a detecção de mineração ilegal em uma área pelo titular e requerente de uma Guia de Utilização (GU) também pode impactar a emissão dela, dependendo das circunstâncias envolvidas. A prática de mineração ilegal, seja pelo próprio titular ou por terceiros, sem a devida autorização da Agência Nacional de Mineração (ANM) e sem o licenciamento ambiental, viola a legislação mineral e ambiental vigente, o que pode levar à suspensão do processo de concessão da GU até que a situação seja regularizada.
No entanto, se a mineração ilegal for realizada por terceiros, sem o conhecimento ou autorização do titular da área, o requerente da GU não será, a princípio, responsabilizado diretamente por essa prática ilícita. Nesse caso, o titular deve comunicar imediatamente a ANM e as autoridades competentes, como o Ministério Público Federal, Advocacia Geral da União e os órgãos ambientais, sobre a ocorrência de atividade ilegal. A partir dessa comunicação, as autoridades devem tomar as medidas necessárias para cessar a exploração irregular e responsabilizar os envolvidos.
Ainda assim, a emissão da GU poderá ser impactada se a ANM entender que a mineração ilegal comprometeu as condições técnicas e ambientais da área, sendo possível que a agência exija a regularização da situação antes de aprovar a GU. Portanto, a recomendação é que o titular da área tome todas as providências legais assim que identificar a mineração ilegal, a fim de evitar prejuízos ao seu processo de obtenção da GU.
Antes de submeter o pedido de uma Guia de Utilização, o requerente deve considerar as seguintes questões para garantir que seu pedido seja atendido:
Com base na legislação e nas normas da ANM, a aprovação de uma Guia de Utilização depende do cumprimento rigoroso dos requisitos técnicos, ambientais e jurídicos. O não atendimento a esses requisitos ou a existência de conflitos de áreas pode resultar no indeferimento do pedido. Portanto, é essencial que o requerente esteja atento à documentação exigida, à regularidade ambiental e à justificativa técnica para garantir a aprovação de sua GU.
Fábio Martinelli