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Seria correta a exigibilidade da Taxa Anual por Hectare (TAH), da Taxa de Fiscalização de Recursos Minerais (TFRM), e a incidência do ITR sobre áreas destinadas à mineração em área rural? Ademais, como tratamos a sistemática atual de apuração da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM) e a possibilidade de redução da base de cálculo?
Em que pese as especificidades de cada tema, é possível articular uma reflexão integrada sobre a aplicabilidade das normas, os parâmetros de análise e as soluções administrativas e judiciais adequadas para proteger os interesses da empresa.
A obrigação de recolhimento da TAH encontra fundamento normativo na Resolução ANM nº 95/2022, que disciplina a exação estabelecendo valores diferenciados para cada fase da atividade minerária. Quanto à autorização de pesquisa, a norma não condiciona a incidência da taxa à efetiva realização de atividades exploratórias, configurando-se o fato gerador pela mera titularidade do direito minerário.
Sob a perspectiva jurídico-tributária, a TAH qualifica-se como taxa de polícia, cuja hipótese de incidência materializa-se no exercício regular do poder de polícia exercido pela Agência Nacional de Mineração (ANM), que fiscaliza, regula e promove o ordenamento do aproveitamento dos recursos minerais. Portanto, a titularidade da autorização de pesquisa, por si só, constitui fato gerador suficiente da exigência, independentemente da execução de trabalhos de pesquisa no período correspondente.
Não obstante o regramento geral, subsistem exceções normativas que afastam a exigibilidade da TAH. A cobrança revela-se juridicamente indevida quando a área for declarada indisponível por motivo superveniente — como a instituição de unidade de conservação ou a identificação de sítio arqueológico —, quando houver renúncia formalizada pela titular da autorização e desde a publicação do ato que a aceite, ou ainda quando houver declaração de caducidade do título, caso em que a exigência da TAH cessa a partir da data da publicação do referido ato.
Sob o aspecto estratégico, recomenda-se que a empresa verifique a ocorrência de quaisquer circunstâncias excludentes ou suspensivas da incidência da TAH. Na ausência de tais pressupostos, o adimplemento tempestivo da obrigação constitui medida prudente para evitar multa, juros e a inscrição em dívida ativa.
Contudo, havendo fundamentos jurídicos consistentes, não se pode descartar a via judicial. A Ação Declaratória de Inexigibilidade do Débito Tributário, cumulada com pedido de tutela provisória de urgência, constitui o instrumento processual adequado para suspender a exigibilidade do crédito e evitar a inscrição em dívida ativa ou a adoção de outras medidas coercitivas. O ajuizamento da ação, todavia, deve ser precedido de análise criteriosa quanto à consistência dos argumentos jurídicos e à relação entre custos e benefícios do litígio.
A análise da TFRM incidente sobre concessões de lavra demanda exame criterioso acerca da competência tributária do ente estadual para instituir taxa vinculada ao exercício do poder de polícia, bem como da observância dos parâmetros constitucionais aplicáveis às taxas.
A Taxa de Fiscalização de Recursos Minerais, quando instituída por unidade federativa, tem sua constitucionalidade reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal, desde que atendidos cumulativamente os requisitos constitucionais das taxas: (i) vinculação inequívoca ao exercício do poder de polícia; (ii) proporcionalidade e razoabilidade entre o valor cobrado e a atividade fiscalizatória efetivamente prestada; e (iii) adequação da base de cálculo e alíquotas aos princípios da capacidade contributiva e da vedação ao confisco.
Portanto, o recolhimento da TFRM só deve ser contestado judicialmente se houver elementos concretos que demonstrem a ausência de efetiva prestação do serviço de fiscalização, desproporcionalidade manifesta entre a carga tributária e o custo da atividade estatal, ou caráter confiscatório da cobrança. Ausentes tais vícios, o adimplemento regular da obrigação tributária previne litígios e riscos administrativos.
Do ponto de vista estratégico, recomenda-se a realização a análise documental e factual que comprove — ou não — a concretude da fiscalização estatal, permitindo a formulação de uma impugnação administrativa fundamentada e, se necessário, a propositura de ação judicial visando a declaração de inconstitucionalidade ou ilegalidade da cobrança, com base na falta de relação de causalidade entre a taxa e a atuação estatal fiscalizatória.
A incidência do Imposto Territorial Rural sobre imóveis onde a mineradora desenvolve suas atividades de mineração, requer análise aprofundada da natureza jurídica do bem e da destinação econômica efetiva de sua área. A legislação tributária e a doutrina que regulam o ITR adota como critério distintivo a destinação do imóvel, nos termos do Estatuto da Terra e da legislação correlata, vinculada à utilização para fins agropecuários, extrativistas, florestais ou agroindustriais.
No entanto, quando a destinação principal da área é a atividade de mineração — com lavra, pilhas de estéril, instalações e outras estruturas inerentes à extração mineral — sustenta-se a tese de que o ITR não é o tributo adequado, ante a existência de regime tributário próprio para a mineração, notadamente a CFEM, que representa encargo específico sobre a exploração de recursos minerais. Nessa linha, a aplicação do ITR à área destinada à mineração pode representar bitributação indevida, em razão da dupla imposição sobre a mesma base econômica, ou ao menos visar tributar atividade que não se presta ao fim do imposto, qual seja, incentivar o uso produtivo da terra em atividades agrícolas.
A jurisprudência apresenta orientações divergentes sobre a matéria, sendo necessário examinar o caso concreto para aferir a prevalência da tese de inexigibilidade do ITR sobre a porção destinada à atividade minerária.
Na esfera administrativa, recomenda-se a abertura de procedimento perante a Receita Federal do Brasil visando à retificação da classificação do imóvel, acompanhada de laudos técnicos que demonstrem a destinação efetiva das áreas. Na esfera judicial, sendo caracterizada a destinação minerária predominante, é possível pleitear a restituição dos valores pagos indevidamente com fundamento nos artigos 165 e 168 do Código Tributário Nacional, observando-se o prazo quinquenal, contado da data de cada de recolhimento indevido. Assim, havendo elementos que comprovem a destinação minerária da área, impõe-se a propositura de demanda judicial para a recuperação de valores pagos nos últimos cinco anos.
A sistemática atual de apuração da CFEM na modalidade “venda”, regulamentada pela Lei nº 13.540/2017, e a possibilidade de redução da base de cálculo exigem análise minuciosa do conceito legal de receita bruta de venda e das deduções admitidas por lei e pela interpretação administrativa e jurisdicional.
A CFEM tem como base de cálculo a receita bruta da venda do recurso mineral. Todavia, o regime legal admite controvérsias interpretativas significativas quanto à composição dessa base, especialmente no que concerne à inclusão ou exclusão de tributos incidentes sobre a operação comercial, tais como o ICMS e o PIS/COFINS.
No mercado interno, o ICMS, tributo estadual incidente sobre operações de circulação de mercadorias, constitui objeto de divergência de entendimentos doutrinários e jurisprudenciais. Parcela significativa da doutrina reconhece que o ICMS não deve integrar a base de cálculo da CFEM, visto que constitui valor que não ingressa definitivamente no patrimônio da empresa, sendo repassado ao Fisco estadual. Essa interpretação alinha-se à tese firmada pelo STF no RE 574.706/PR (Leading case da exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS/COFINS).
Similar controvérsia recai sobre o PIS/COFINS. Há entendimentos, tanto na seara administrativa quanto judicial, que admitem a exclusão dessas exações da base de cálculo da CFEM quando sua inclusão configuraria bis in idem.
No mercado de exportação, a imunidade constitucional do ICMS sobre operações de exportação, prevista constitucionalmente, já afasta a discussão quanto à inclusão desse tributo na base de cálculo da CFEM. Contudo, questões relativas à dedutibilidade de outros encargos e custos operacionais, tais como tarifas portuárias, tributos incidentes na cadeia de comercialização internacional e despesas comprovadamente vinculadas à operação de exportação, desde que previstas normativamente e adequadamente documentadas.
Em síntese, a redução da base da CFEM é juridicamente viável em hipóteses específicas, condicionada à observância de requisitos cumulativos: (i) identificação precisa da natureza jurídica dos valores cuja exclusão se pretende excluir; (ii) apresentação de documentação hábil a demonstrar que tais valores não integram a receita auferida da empresa, mas mero ingresso transitório; e (iii) fundamentação jurídica e jurisprudencial robusta que sustente a exclusão pretendida.
Recomenda‑se, portanto, a realização de estudo técnico-contábil e jurídico destinado a quantificar as deduções potenciais, subsidiando a elaboração de defesas administrativas e, quando estrategicamente conveniente, o ajuizamento de ações judiciais para reconhecimento da redução da base imponível. Tais medidas devem ser invariavelmente instruídas de pareceres técnicos e laudos periciais que demonstrem a razoabilidade e legalidade das deduções pleiteadas.
Fabio Martinelli e Caio Galatti