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Uma das características mais importantes do amadurecimento democrático de uma sociedade é o crescimento de sua capacidade de desenvolver mecanismos e instituições que se associam ao estado na busca do bem-estar da população. Quanto mais sólido e atuante for o chamado terceiro setor, mais empoderadas serão as sociedades modernas. Esta tendência, muito presente nas sociedades mais avançadas, nada tem a ver com as construções esclerosadas de uma velha batalha entre estatismo e privatismo.
Enquanto a interdição ideológica não permite que esta luta do século XX se resolva pacificamente, a própria sociedade vai inovando, pragmaticamente, suas formas de cooperação com o interesse público. As organizações sociais (OS) são uma destas inovações. Tenho prazer em lembrar que a primeira legislação entre nós nasceu no Ceará. Em 1998 o governo federal põe em vigor a primeira lei nacional regulando o tema das OS, a Lei nº 9.637[1], de 15 de maio daquele ano, e já em 23 de março de 1999 é promulgada a Lei nº 9.790[2] tratando da qualificação das Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIPs).
De lá para cá muitas experiências exitosas, outras nem tanto, e alguns problemas derivados de situações práticas não previstas, recomendam uma renovação da discussão acerca da importância sensível destas instituições e a necessidade inadiável de aperfeiçoamento institucional de sua prática.
A quem não se obriga à intimidade do assunto, repetimos os argumentos mais relevantes de todos em defesa das OS: eficiência, economicidade, flexibilidade e qualificação dos serviços entregues. É falsa a discussão de que o serviço público não possa fazer boas entregas. Quem viveu, como nós, uma pandemia como a recente da COVID 19, sabe que o serviço público, no caso, de saúde, se agigantou e salvou incontáveis vidas mesmo que no início especialmente, mas durante vários episódios durante a pandemia, faltassem até o básico, como máscaras de proteção ou mesmo, doída lembrança, oxigênio para pacientes que morreram sufocados também pela incúria.
Mas é indisfarçável que uma verdadeira OS – aquela que nasce sem fins de lucro, emergindo do terceiro setor, tomou relevância crescente entre nós, especialmente na proporção em que a administração pública brasileira mergulha em sua mais agônica crise de financiamento e seus padrões de gestão, salvo exceções, estão amarrados a práticas cartoriais que herdamos do século XIX.
Entre nós a premissa é inversa à do mundo civilizado: lá todos são honestos até que o estado prove o contrário. Entre nós, a vã ilusão da total hipertrofia das estruturas de controle não disfarça a premissa inversa: todos são desonestos até que se provem o oposto. O custo disto é desconhecido do grande público. Toneladas de remédios são jogadas fora pelo Brasil porque os estoques são administrados tentando o impossível, que é fazer com o que os fluxos das necessidades reais de atendimento à população coincidam com os prazos de compras, licitações, judicialização, suborno e coisas que tais.
A rigidez burocrática garante a impunidade de maus servidores públicos. Nenhum prêmio tem a distingui-los, os bons servidores que, para além de cumprirem suas tarefas, o fazem de maneira respeitosa e mesmo amorosa ao nosso sofrido povo.
As OS, por sua natureza jurídica mesma, permitem uma revolução nestas práticas e em outras tantas!
É hora de uma extensa avaliação desta realidade, de separar o pouco joio do muito trigo que há na área e aperfeiçoar a sua institucionalidade.
Nós, do Porto Advogados, estamos ajudando neste passo. Aliamos a extraordinária expertise jurídica de nosso corpo de advogados com minha vivência política e de administração pública e estamos atuando junto à Câmara dos Deputados, no sentido de auxiliar, neste passo de modernização da legislação. Tem sido excelente a receptividade dos senhores deputados, especialmente do Deputado Relator Luiz Gastão e do líder da Maioria, deputado André Figueiredo, às ponderações que estamos amadurecendo.
A regularização dos fluxos de pagamento, a premiação, não para a OS, mas para a reinversão na própria unidade de saúde (por exemplo) dos ganhos de eficiência obtidos, a blindagem sólida às interferências político eleitorais ilegítimas, são exemplos de alguns passos modernizantes que estamos ajudando a debater, seguros de que os senhores deputados serão muito capazes de achar o melhor caminho ao futuro melhor. O documento em elaboração é o Projeto de Lei nº 10.720/2018 que trata do marco legal das Organizações Sociais.
Ciro Gomes, do Porto Advogados
[1] Dispõe sobre a qualificação de entidades como organizações sociais, a criação do Programa Nacional de Publicização, a extinção dos órgãos e entidades que menciona e a absorção de suas atividades por organizações sociais, e dá outras providências.
[2] Dispõe sobre a qualificação de pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, como Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público, institui e disciplina o Termo de Parceria, e dá outras providências.